Bob Dylan apresenta canção inédita ao vivo

Bob Dylan no Japão (2014)Nos primeiros shows de 2014, Bob Dylan resolveu acrescentar pouca coisa ao que vinha apresentando no ano passado. Contudo, escolheu bem: trouxe ao palco de Tóquio a primeira versão ao vivo de “Huck’s Tune”.

Gravada em 2006 (no mesmo estúdio usado pars registrar Time Out Of Mind), a música fez parte da trilha sonora do filme Lucky You e só entrou na discografia oficial de Dylan em 2008 – quando foi incluída no Bootleg Series Vol. 8: Tell Tale Signs.

Ouça a versão de estúdio:

Com uma ligeira influência na melodia da tradicional canção escocesa “Tramps and Hawkers”, “Huck’s Tune” seduz pela doçura como Dylan canta a possível história de desistência. A versão ao vivo me lembrou da releitura que Bob fez da música “Shadows”, de Gordon Lightfoot, em outubro de 2010.

Ouça a versão ao vivo (Tóquio, 04/04/14):

Bruce Springsteen: a influência dylanesca no “The Boss”

Em turnê pela América do Sul, Bruce Springsteen tem em sua biografia uma relação bem próxima a Bob Dylan. Além de ser influenciado por Bob, Bruce foi escolhido para ocupar a vaga de “novo Dylan”.

“O irmão que eu nunca tive”

Bob e Bruce em 2002

Em 1988, Bruce Springsteen foi escolhido para empossar Bob Dylan ao Rock and Roll Hall of Fame. Ao iniciar seu discurso, Bruce relembrou a primeira vez que ouviu o homenageado:

“A primeira vez que eu ouvi Bob Dylan eu estava no carro com minha mãe ouvindo rádio e então veio aquele tiro da caixa de bateria que soava como alguém arrombava com o pé a porta da sua mente: ‘Like a Rolling Stone’. Minha mãe – ela era tão rígida com rock’n’roll, ela gostava do estilo – sentou durante um minuto e então olhou para mim e disse: ‘Este cara não sabe cantar’. Mas eu sabia que ela estava errada. Eu sentei lá e eu não disse nada, mas eu sabia que eu estava ouvindo para a voz mais dura até então. Era magra e soava de alguma forma simultaneamente jovem e adulta.”

Então Bruce afirma que sem Bob a história do rock ficaria orfã de alguns alicerces: Sgt. Peppers, dos Beatles; Pet Sound, dos Beach Boys; “God Save the Queen”, dos Sex Pistols; “What’s Going On”, de Marvin Gaye; e tantos outros.

No final de sua fala, Springsteen pega emprestado uma frase que Bob Dylan escreveu em “Lenny Bruce”: “Você foi o irmão que eu nunca tive”.

O “novo Dylan”

Durante a Rolling Thunder Revue

John Hammond, que mais de uma década atrás havia assinado Bob Dylan, contratou Bruce Springsteen para a Columbia em 1972. Há uma história que três anos depois, durante a Rolling Thunder Revue em novembro de 1975, Bob Dylan se encontrou com Bruce no camarim. Ao cumprimentá-lo, Bob teria dito: “Olá, ouvi dizer que você é o novo eu”.

Em 1978, Bob Dylan foi acusado de “pegar emprestado” algumas características do “The Boss”. Uma delas foi a inclusão de um saxofonista na gravação de Street Legal e a turnê subsequente. A outra foi a utilização de discursos que precediam as canções – a maioria deles misturando passagens autobiográficas e ficção.

Há uma influência que é inegável: em 1981, Bob Dylan optou por chamar o co-produtor de Bruce, Chuck Plotkin, para ajudá-lo na gravação do álbum Shot Of Love. Na turnê após o lançamento do disco, ao comentar sobre as apresentações, Bob afirmou: “Eu me sinto muito conectado a este show. Eu sinto que eu tenho algo a oferecer. Ninguém mais faz este show – nem Bruce, nem ninguém”.

Mais uma: em 1990, durante um show que durou mais de quatro horas (as apresentações de Bruce são conhecidas por chegar a mais de três horas), Bob Dylan arriscou uma versão de “Dancing In The Dark”.

Bob Dylan vs. Bruce Springsteen?

Sem legenda!

É inevitável a comparação entre Bob e Bruce. Ambos estão diretamente conectados a minorias e a suas lutas por justiça. No caso de Bob, sua ligação é mais íntima na luta pelos direitos civis dos negros e nas mazelas da humanidade. Bruce acaba representando algo mais próximo do jovem da década de 70 e 80: a classe média trabalhadora, o proletário que com seu suado salário consegue sair com a namorada para uma sexta-feira de diversão.

Em um nível maior ou menor, os dois compartilham de um carisma que os fazem parecer como nós. Ou o contrário: nós nos achamos mais parecidos com eles. Tanto Bob quanto Bruce dão voz a um sentimento que é comum a todos que realmente se importam.

Vídeos:

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Balanço da turnê AmericanaramA

AmericanaramA

Terminou no último domingo, em Mountain View (Califórnia), a turnê AmericanaramA. A excursão que contou com Bob Dylan, Wilco, My Morning Jackets foi vista em 27 cidades desde seu início, no dia 26 de junho. Eu tive o privilégio de ver três edições (em Atlanta, Nashville e Memphis).

Abaixo, alguns destaques dylanescos da turnê:

Repertório intacto

Se em turnês anteriores Bob Dylan criava um clima de tensão – para muitos prazeroso – a respeito de seu repertório, em 2013 ele escolheu a mesmice tão frequente para outros artistas.

Apesar das pouquíssimas alterações feitas, Bob Dylan ousou ao dar ênfase não aos “anos dourados”, mas à sua discografia mais recente – principalmente se levar em conta que ele dividia os palcos com duas bandas relativamente jovens (ou às vezes justamente por isso: preferiu trazer para a estrada as canções contemporâneas de seus colegas e suas audiências). O fato é: mais da metade do repertório se constituiu de canções pós-Time Out Of Mind, de 1997. Do disco mais recente, Tempest, Dylan escolheu três faixas: “Soon After Midnight”, “Duquesne Whistle” e “Early Roman Kings”.

Com essa constante, houve quem fizesse especulações. Há quem imagine que um disco ao vivo esteja se formando; ou talvez Dylan estivesse esperando que seu novo guitarrista aprendesse um set básico antes de complicas. Torço pela primeira opção. E se a segunda for a correta, Bob receberia uma péssima notícia.

Entra-e-sai guitarrístico

Bob Dylan iniciou os shows de 2012 com uma mudança em sua banda. Ao invés de convocar Charlie Sexton, chamou Duke Robillard, guitarrista com forte influência blues que já havia tocado com Dylan no disco Time Out of Mind. Contudo, no show em Memphis, misteriosamente Duke foi substituído por Charlie Sexton. Algumas especulações foram feitas da razão pela mudança. A partir de postagens de Duke no Facebook, ficou claro que houve algum conflito. Mesmo ele afirmando que não tenha sido de cunho musical, alguns fãs opinaram que o guitarrista estava invadindo os solos de gaita de Bob.

Depois de tocar alguns shows, Charlie foi substituído durante a passagem da turnê pelo Canadá. Dessa vez, a escolha foi ainda mais surpreendente: Colin Linden. O guitarrista canadense nunca havia tocado com Dylan, mas em seu currículo possui projetos com T-Bone Burnett, Lucinda Williams e The Band. Alguns shows antes de sua primeira participação, algumas testemunhas viram um cara com o mesmo semblante na mesa de som ao lado do palco, ouvindo os sons num fone de ouvido e fazendo anotações – provavelmente Colin tomando nota das canções e os diversos caminhos trilhados pelo bando dylanesco.

A partir daí, houve um certo rodízio entre Colin Linden e Charlie Sexton, que alternava entre apresentações com Bob e shows com o grupo de country/folk Court Yard Hounds.

Bob Dylan & convidados… juntos?

Nos últimos shows da turnê, Bob Dylan chamou ao palco Jim James (My Morning Jacket), Jeff Tweedy (Wilco) e de vez em quando algum músico da banda de abertura.

Em Toronto, escolheram a tradicional “Twelve Gates to The City”. A partir do show em Virginia, a trupe escolheu a belíssima “The Weight” dos ex-funcionários de Dylan, The Band.

Bobby Vee

Bobbies: Vee & Dylan

Em sua cidade natal, Duluth, Bob Dylan resolveu não só presentear seu berço como fazer uma homenagem a uma de suas influências. Bobby Vee recrutou Bob quando ele ainda era um Zimmerman para tocar piano em alguns shows no fim dos anos 50.

Antes de tocar “Suzie Baby”, de Vee, Dylan discursou (sim, ele falou! Até então nem um “thank you” havia sido feito na turnê):

“Eu já toquei ao redor do mundo com tudo quanto é gente. Todo mundo desde Mick Jagger até Madonna. Mas a mais bela pessoa que eu já dividi o palco foi com Bobby Vee. Ele costumava cantar uma música chamada ‘Suzie Baby’”.

A nova turnê de Bob Dylan está marcada para começar dia 10 de outubro e viajará pela Europa.