…turvava desde o coração

Tenho lido No Direction Home e afirmo que é um dos melhores livros sobre Dylan que já li. Compartilho um parágrafo em que Robert Shelton descreve duas semanas em que Bob se apresentou no Folk City, entre os dias 25 de setembro e 8 de outubro de 1961.

Durante as duas semanas ele alternou três figurinos, um mais imundo que o outro. Um dos trajes consistia numa camisa azul desbotada, calça cáqui, um pulôver escuro sem mangas, uma incongruente gravata larga, tudo sob seu famoso chapéu. Outras vezes, ele usou um paletó de camurça e uma camisa de lã sem gravata. Seu violão Gibson tinha um papel com a ordem das músicas colado na lateral superior, e o suporte de gaita ficava pendurado no pescoço. Sua aparência era minuciosamente descuidada e muito mirrada e franzina – até que ele começasse a cantar. Sua voz atormentada e comprimida parecia estar lutando para sair da garganta como um fugitivo da cadeia. Era uma voz enferrujada, que lembrava as gravações antigas de Guthrie. Era gravada em cascalho, como a de Van Ronk, e por vezes murmurava, como a de Elliott. E, ainda assim, era uma voz diferente de todas as outras. Não se pensava nela como algo belo ou sinuoso, mas como algo que turvava desde o coração. Bob não parecia nem um pouco urbanizado, mas mais ainda como um velho cantor de folk que trabalhasse numa fazenda. A maior parte do público gostou de Dylan naquelas duas semanas e o viu como um cantor étnico consumado, mas muitos o consideraram apenas uma piadas de mau gosto.

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