Bob Dylan x Soy Bomb

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Fazia apenas cinco meses que Bob Dylan lançara o disco Time Out Of Mind, famoso por colocar o artista de volta aos holofotes e resenhas positivas, quando subiu ao palco do 40º Grammy para tocar a faixa de abertura, “Love Sick”.

Bob já ganhara dois prêmios naquela noite – Melhor Disco de Folk Contemporâneo e melhor Disco de Vocal Masculino – e ainda levaria o mais aclamado, de Disco do Ano. Anos antes, recebera uma condecoração do Grammy pelo conjunto da obra, um claro sinal de que não mais produziria algo relevante.

Assim, se apresentar na premição com uma música recém-lançada era mais uma demonstração de renascimento do que de retomada (o que ficaria mais evidente depois que, na mesma época, uma doença quase o matou).

Voltemos a apresentação: após uma introdução pelo ator Kelsey Grammer, as câmeras se voltam para o palco principal. Nele, a plateia observa uma segunda plateia contornar o (segundo) palco. Uma batida constante e triste do slide de Bucky Baxter inicia a canção. Bob Dylan começa a cantar no mesmo momento que começa a palhetar sua Fender Stratocaster. Apesar da simplicidade da estrutura, não é uma canção fácil. É triste, raivosa com um eu-lírico duvidando das fontes da dor e do seu próprio sentimento.

Tudo ia bem até que um indivíduo sai do meio da plateia do entorno, tira a camisa e começa a dançar freneticamente. Em seu torso, duas palavras:

Soy
Bomb

Bob Dylan percebe a presença, mas mantem a calma. Em anos de experiência, sabe que o melhor a se fazer é seguir em frente, sem se importar. O guitarrista Larry Campbell lembra do ocorrido:

“Este cara aparece, tira a camiseta e começa a girar sem qualquer relação com a música. Meu pensamento inicial foi ‘Será que isso foi algo que Bob planejou e eu simplesmente não peguei?’. Então Bob olha para mim: ‘Quem é a porra desse cara?’”

Após pessoas da “plateia” retirarem o Soy Bomb, o clima de tensão dá lugar a risadas entre os músicos.

Conheça Michael Portnoy

10 anos após o incidente, o site The Hollywood Reporter resolveu rememorar o dia com uma entrevista com o Soy Bomb, Michael Portnoy. Ator residente de New York, Portnoy viu uma brecha para abrir mão dos 200 dólares de cachê para fazer uma “manifestação artística” para aparecer em rede nacional. Segundo ele, a escolha de “bomba de soja” é porque soja representa uma densa e nutricional vida e que ele queria que a arte representasse uma “densa, transformacional e explosiva vida”.

Se era para ser assim, era só deixar Bob Dylan fazer o que ele sabe fazer…

Portnoy hoje possui alguns projetos excêntricos e passa boa parte do ano fora dos EUA. Os poucos segundos de fama até que renderam frutos.

O Grammy tratou de excluir a invasão e fez uma versão editada da apresentação:

Resoluções de Ano Novo com Bob Dylan

  1. Passar mais tempo com a família e amigos;
  2. Fazer mais exercícios;
  3. Perder peso;
  4. Parar de fumar;
  5. Curtir mais a vida (“eu vou tentar esta”);
  6. Parar de beber;
  7. Sair do “vermelho”;
  8. Aprender algo novo (“essa é fácil se você continuar ouvindo o Theme Time Radio Hour”);
  9. Ajudar outros e voluntariar-se;
  10. Organizar-se.

E aqui está as resoluções de ano novo de Woody Guthrie:

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Um feliz ano novo a todos!

4 razões para descartar e 5 razões para ouvir Triplicate

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Bob Dylan anunciou o lançamento de um novo álbum. Triplicate será seu primeiro disco-triplo, com 30 faixas divididas em discos temáticos, e o terceiro com covers de clássicos americanos (com abordagem parecida que Shadows In The Night, de 2015, e Fallen Angels, de 2016).

Assim que foi divulgado, alguns fãs criticaram o lançamento de mais um disco no formato quero-ser-Frank-Sinatra. Abaixo, algumas razões para desdenhar e outras para se interessar por Triplicate.

Porquê descartar:

1) Último álbum de inéditas foi em 2012

Se não houver nenhum outro disco de estúdio em 2017, serão 5 anos sem um disco de inéditas. O último, Tempest, possui ótimas canções que entraram no repertório de Dylan nas turnês recentes, como “Duquesne Whistle”, “Long and Wasted Years”, “Pay In Blood” e “Early Roman Kings”.

2) 52 covers nos últimos 3 anos

Isso mesmo. Bob lançará CINQUENTA E DUAS músicas que não são dele – só nos últimos três lançamentos de estúdio (sem contar os discos da “Bootleg Series”). Isso porque ele ganhou um Nobel de Literatura pela suas composições…

3) Contexto político americano instiga

Sabemos que Dylan não costuma de posicionar claramente em questões políticas, mas é inegável o teor engajado em boa parte de sua carreira. E com Trump no mais alto cargo da democracia americana, assunto não faltaria, mesmo que indiretamente.

4) The Voice é The Voice

Bob nunca foi famoso por ser um ótimo cantor. De fato ele consegue trazer interpretações intensas, mas escolher canções já cantadas por Frank “The Voice” Sinatra (com exceção de “Braggin’” de Triplicate) e sua incomparável qualidade vocal é pedir para ser criticado – agora imagina fazendo isso 51 vezes!

Porquê ouvir:

1) Discos temáticos

As 30 músicas de Triplicate estarão divididas em três discos temáticos: ‘Til The Sun Goes Down, Devil Dolls e Comin’ Home Late. Será interessante se aprofundar nas canções e interpretar as nuances das canções a partir desta divisão.

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2) Presenciar uma “fase odiada”

Para aqueles que acompanham diretamente Dylan apenas nos últimos 20 anos, será interessante vivenciar uma fase polêmica. Apenas para citar outras: a passagem da fase acústica para fase elétrica nos anos 1960; sua ida ao estilo country e crooner no início dos anos 1970; e a fase cristã do final dos anos 1970 e início dos 1980. Todas elas foram amplamente criticadas, mas depois tiveram seu valor revisto. Será que isso se mantem?

3) Arranjos intimistas e delicados

Nos discos anteriores, é muito bonito ver como Bob e sua banda, composta por cinco músicos, conseguiu adaptar com muita qualidade os arranjos originais de orquestras (apenas com algumas exceções, que tiveram a companhia de sopros). Enquanto em Shadows… o foco foi o pedal steel de Donnie Herron, em Fallen Angels o protagonista foi Charlie Sexton. Teremos um destaque diferente dessa vez?

4) Depois de covers, sempre teve coisas boas

Uma análise rápida mostra que depois de discos com covers, Dylan sempre se renovou e lançou coisas muito boas. É o caso de New Morning após o lançamento de Self Portrait (com uma boa quantidade de covers); ou, o mais emblemático, com o lançamento de Time Out Of Mind, depois de dois discos de canções tradicionais (sem autores conhecidos) – Good As I Been To You e World Gone Wrong. Talvez possamos esperar coisa muito boa ainda em 2017 (lembrando do boato de um disco com a volta do produtor Daniel Lanois, que fez justamente Time Out…).

5) 75 anos e ainda se desafiando

Para começo de conversa, ele não precisava mais lançar disco nenhum. Ele já se provou ser um artista único e incansável. Mas, apesar disso, insiste em se colocar a prova, testando seus limites (e seu público, admito) em caminhos obscuros e inéditos. Isso é, no mínimo, muito respeitável.

Para concluir, uma frase dylanesca: “Só porquê você gosta das minhas coisas não significa que eu te devo alguma coisa”.

Afinal, a carreira é dele. ;)

Confira a playlist no Spotify com versões anteriores das canções de Triplicate. Aproveite e siga o Dylanesco por lá.