“Um artista tem que ter cuidado para nunca realmente chegar a um local onde ele acha que ele ‘está’ em algum lugar. Você sempre tem que perceber que você está constantemente em um estado de ‘vir a ser’. Enquanto você ficar nessa esfera, você meio que vai ficar bem.”
Bob Dylan, em No Direction Home“- Hey, eu adorei a nova versão de ‘It’s Alright Ma…’, mas você nunca toca a versão do disco?
– Bem, você sabe… um disco é apenas um registro do que vocês estava fazendo naquele dia. Você não quer viver o mesmo dia várias vezes, não é?”
Diálogo entre Chris Shaw e Bob Dylan
Mais do que saber jogar o jogo, Bob Dylan parece ser o único a conseguir ditar as regras. Após 73 anos de vida, 61 discos, mais de 500 músicas e cerca de 3.300 shows, Bob Dylan se mantém como um dos únicos de sua idade – e um dos poucos músicos de hoje em dia – a conseguir se reinventar tantas e tantas vezes.
Talvez seja repetitivo dizer isso, mas ainda me surpreende a maneira como Bob Dylan se expressa. Se no ano passado ele resolveu alterar alguns versos de canções dos anos 70 (“Simple Twist of Fate” e “Tangled Up In Blue”), em abril trouxe “Workingman’s Blues #2”, de 2006, com novas estrofes e um arranjo completamente diferente do original.
Agora, há apenas algumas semanas, ele surpreende a todos ao disponibilizar um cover de Frank Sinatra para um próximo disco – dois anos após seu último de inéditas. “Tempest” é um disco pesado e raivoso – Dylan late, grunhe e esbraveja verdades e reflexões. Um par de anos depois, ele volta calmo e com uma voz bem distante da rouquidão pigarreada que registrou em 2012. E esse são apenas dois exemplos.
As duas frases introdutórios talvez sejam os melhores conceitos para conseguir definí-lo como artista. A estrada é a casa do andarilho. A perseguição é o alvo do caçador. A inspiração é o prazer do pintor. E a vida, tão efêmera quanto imprevisível, é ao mesmo tempo inspiração, perseguição e estrada para Bob Dylan.
É preciso admitir que ele parou de explorar novos mundos – como fez em outros tempos ao misturar folk e rock, bíblia e rock, poesia e rock… – mas isso não é descrédito, apenas escolha. Bob preferiu ignorar toda a galáxia para focar esforços em esmiuçar e descobrir cada detalhe de uma terra única e desconhecida. A natureza dylanesca é tão complexa quanto a nossa; a fauna e flora possuem os mais diversos tipos de sentimentos, pensamentos e ideiais. E tudo está em constante transformação.
Ele, observando e vivendo dia após dia, é o único a conseguir descrever com esmero todos os meandros desse mundo que reflete o nosso. E nós, meros mortais do planeta terra, só podemos saudá-lo por mais um ano com a gente.
Parabéns, Mr. Dylan.